Combate ao desmatamento ilegal precisa de embasamento técnico

11 de janeiro de 2023 5 mins. de leitura
Problema só será resolvido quando sua dinâmica for integralmente compreendida

Por Maurício Palma Nogueira

Em relação ao agronegócio, o novo governo se inicia com a expectativa de que a imagem ambiental do Brasil irá melhorar, possibilitando um posicionamento comercial mais positivo diante dos países mais exigentes. No entanto, é fundamental separar as narrativas dos fatos sob pena de, lá na frente, colhermos frustrações ao invés de resultados.

É preciso aceitar uma verdade inconveniente sobre o combate ao desmatamento ilegal no Brasil.

Nenhum governo conseguiu encontrar e aplicar uma solução realmente definitiva. E mesmo sem entregar resultado algum, sobram gestores que surfam a agenda da autopromoção, principalmente em fóruns internacionais.

Como o debate é conduzido pelo sensacionalismo, estimulado até mesmo por pesquisadores, tanto a imprensa como lideranças globais acabam embarcando nos discursos sem analisar os dados.

Por exemplo, sob a gestão de Marina Silva, entre 2003 e 2008, foram desmatados 11,1 milhões de hectares na Amazônia Legal – que inclui áreas de biomas Cerrado, Amazônia e Pantanal – uma média de 1,85 milhão de ha/ano. Em sua gestão, o desmatamento aumentou durante dois anos e depois recuou por três anos consecutivos. Em 2008 (seu último ano), o desmatamento voltou a aumentar cerca de 10%, segundo dados do Inpe, através do Prodes.

A partir de 2009, iniciou-se um período de aparente sucesso, com drástica redução nos níveis de desmatamento que chegaram ao seu ponto mais baixo em 2012, sob a gestão da ministra Izabella Teixeira.

Naquele ano foram desmatados 457,1 mil hectares na Amazônia Legal. A ministra, que em seu currículo comemora ter administrado o nível mais baixo de desmatamento já registrado, entregou o cargo em 2016 com um aumento de 72% na área desmatada quando comparado ao que havia sido registrado em 2012. Em 2016 foram desmatados 789,3 mil hectares.

O avanço do desmatamento foi estancado durante o período do governo de Michel Temer e voltou a subir com o governo Bolsonaro. Entre 2019 e 2022, o desmatamento aumentou durante 3 anos consecutivos e recuou para 1,16 milhão de hectares no último ano de governo, queda de 11,2% sobre o ano anterior.

Nos últimos 20 anos (2003 a 2022), a área média desmatada na Amazônia Legal foi de 1,11 milhão de hectares ao ano.

O problema do desmatamento ilegal só será resolvido quando sua dinâmica for integralmente compreendida. Esse é o primeiro passo. A partir daí, seriam necessárias diversas ações integradas que envolvem questões de fiscalização, validação do CAR (Cadastro Ambiental Rural), execução do Código Florestal, regularização fundiária, educação e assistência técnica aos pequenos produtores em regiões de fronteira e outros problemas que irão surgindo à medida que a execução de um plano definitivo comece a ser implementado. O problema não será resolvido de imediato.

Na questão da fiscalização, por exemplo, não basta simplesmente encontrar a área desmatada e punir os infratores. É fundamental criar medidas que reduzam o interesse pela operação ilegal. O crime não pode compensar.

E nesse ponto cabe uma reflexão em relação ao novo governo. Ao mesmo tempo que Marina Silva acalma o mercado internacional sobre a agenda ambiental, ela traz consigo um posicionamento equivocado em relação às causas do desmatamento. Seu núcleo de apoio acredita que o agronegócio, especialmente por meio da pecuária, seja o causador do desmatamento.

Essa crença ocorre pelo fato de que áreas desmatadas ilegalmente acabam sendo convertidas em pastagens, o que é facilmente constatado por imagens de satélite. Embora essa conversão ocorra, ela não é causada pela necessidade de avanço da pecuária, mas sim pelo fato de que a implementação de pastagens é a forma mais viável de um operador ilegal ocupar uma área que não poderia ser aberta, por lei.

Tanto é verdade que não há correlação entre a produção de carne bovina e o desmatamento, nem mesmo nas regiões onde o problema ocorre.

A pecuária, que vem crescendo e se modernizando, tem o aumento do pacote tecnológico como alicerce, mesmo nos estados com maior nível de desmatamento registrado nos últimos anos.

A atividade, conduzida em áreas de desmatamento ilegal, é de baixíssimo desempenho e acaba alimentando o mercado informal. As primeiras vítimas dessa prática são os produtores e os frigoríficos que operam dentro da lei. E, ironicamente, são justamente esses os que sofrem as maiores pressões para resolver um problema que não causaram.

O combate ao desmatamento ilegal deve ser conduzido em duas frentes.

A primeira consiste em identificar e punir aqueles que avançam sobre áreas que não deveriam ser desmatadas, especialmente as áreas não destinadas. É fundamental estrangular a atratividade econômica dessa operação.

A segunda é conter os desmatamentos ilegais e não autorizados que ocorrem em propriedades menores, geralmente conduzidos por desconhecimento sobre as leis ou sobre manejos mais viáveis para produção.

Há casos de polícia e há casos de conscientização. E nenhum deles será resolvido sem que haja uma perfeita harmonia entre as ações. É preciso estabelecer um diagnóstico correto e manter a interlocução com o agronegócio.

Se as ações continuarem sendo orientadas pela ideologia, ao invés de ciência aplicada, permaneceremos enxugando gelo e viabilizando boas oportunidades para operações ilícitas.

Maurício Palma Nogueira é engenheiro agrônomo, diretor da Athenagro e coordenador do Rally da Pecuária

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