Arroba bovina: a importância de compreender os indicadores

28 de abril de 2022 5 mins. de leitura
A capacidade de produção aumenta em um ritmo 2,35 vezes maior do que a de estocagem nas fazendas

Por Maurício Palma Nogueira

O tema sustentabilidade atraiu a atenção de muitos pesquisadores de outras áreas, que passaram a estudar evolução e projeções de produção de carne bovina. Infelizmente, grande parte desses profissionais preferiu subestimar o conhecimento e as particularidades da bovinocultura. Por essa razão, alguns estudos amplamente divulgados carregam erros que seriam considerados até infantis, caso os revisores tivessem noção técnica do tema em questão. 

Conclusões sobre produção, que deveriam ser mensuradas em quilogramas de carne com osso, são confundidas com medidas de estoque, avaliadas em cabeças ou unidades animal (450 quilogramas de peso vivo) por hectare. 

Ao leigo, essa diferença pode parecer pequena, visto que há uma correlação entre estoque e produção. No entanto, essa correlação não é linear. Em 30 anos, o estoque médio de gado pela pecuária brasileira aumentou cerca de 70% por hectare. A produção de carne cresceu em torno de 165% no mesmo hectare. A capacidade de produção vem aumentando em um ritmo 2,35 vezes maior do que a de estocagem nas fazendas. Ainda assim, na média, os indicadores estão muito longe da realidade já presente a campo, nas propriedades mais tecnificadas. 

Por negligenciar essas diferenças, estudos conduzidos com erros grosseiros acabam encontrando espaços em importantes revistas científicas. Via de regra, a incapacidade dos autores em explicar tais conclusões para profissionais mais familiarizados com a pecuária tem provocado respostas agressivas e intimidatórias. 

Embora a soberba dos pesquisadores que se esquivam de incluir ou escutar especialistas para montar os seus estudos seja digna de crítica, o setor pecuário também precisa assumir a mea culpa nessa confusão toda. O acompanhamento e divulgação de indicadores técnicos precisam melhorar, visando padronização das métricas em relação a outras atividades. 

Um exemplo é o uso da arroba como medida de peso. A confusão começa com os animais vivos nas fazendas. Pesa-se os bovinos obtendo os resultados em quilogramas de peso vivo e considera-se, gerencialmente, a quantidade de arrobas que tem aquela cabeça. No entanto, quando se fala do peso em arrobas de um bovino não estamos nos referindo ao peso vivo, mas sim o seu peso em carcaça, ou seja, carne com osso. 

A arroba (@) é uma antiga medida de massa de origem árabe, que acabou sendo adotada por espanhóis e portugueses – provavelmente pela relação entre os povos ibéricos e os árabes, seja pelo tempo em que parte da Espanha esteve sob julgo muçulmano ou pela própria troca de conhecimentos de navegação. 

Originalmente, uma arroba equivale à quarta parte do quintal, outra medida de massa. E essa medida varia de acordo com a cultura ou com o povo que a utiliza. 

Sendo assim, pesquisando quanto vale uma arroba, e transformando a sua medida em quilogramas, encontra-se diversos valores: 

– 11,3398 quilogramas, original árabe. 

– 16,3293 quilogramas, usado em algumas regiões na Espanha.  

– 14,688 quilogramas, arredondado para 15 kg (o que utilizamos), usada no Brasil e em Portugal. 

Para quem é acostumado, de imediato já se considera que, em média, metade do peso vivo dos animais é composto pela carcaça, sendo que o restante é a soma de couro, órgãos, cabeça, patas, conteúdo ruminal etc.  

A proporção de carne com osso em relação ao peso vivo do animal é denominada rendimento de carcaça. 

Se for metade, considerada praxe como parâmetro nas negociações de animais jovens, o rendimento de carcaça é 50%.  Quanto melhor for o desempenho zootécnico do animal e do sistema de produção, maior será o rendimento de carcaça no momento do abate. 

Por força do hábito, há quem faça diretamente o cálculo dividindo o peso vivo por 30. Este número já consideraria a quantidade da arroba (15 kg) e o rendimento da carcaça, que é em torno de 50%. Apesar de chegar a um resultado próximo ao correto, o método pode induzir a erros pela própria definição de quanto vale uma arroba.

A principal confusão em torno do uso da arroba não está na transformação da quantidade de quilogramas em arrobas, mas sim no fato de que o peso em quilogramas é usado para o animal vivo, enquanto a arroba é usada para o total da carcaça, mesmo que se esteja falando em animais ainda vivos. Sendo assim, um boi de 300 kg de peso vivo é um boi de 10@ e não as 20@ que seria o resultado da divisão de 300 kg por 15. 

A compreensão sobre os resultados de estudos, pareceres e conclusões tem sido amplamente comprometida pela dificuldade em se padronizar os critérios de métricas e indicadores usados na elaboração.

O esforço para mitigar tais confusões é obrigação de todos.  Tanto do setor pecuário, que precisa ser mais claro em suas comunicações, como dos pesquisadores leigos em relação à atividade, que precisam se inteirar um pouco mais sobre o que estão estudando. 

De nada adiantam estudos densos e robustos se estiverem embasados em premissas erradas. Todos perdem. 

Maurício Palma Nogueira é engenheiro agrônomo, diretor da Athenagro e coordenador do Rally da Pecuária.

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