Para quem está satisfeito com a situação atual, nenhuma solução é adequada e qualquer momento é inoportuno para a mudança
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Por Fernando Cadore
O termo “concorrente” em nossa língua pode ter uma série de sinônimos, palavras que não têm exatamente o mesmo significado, mas que podem ser substitutas em determinados contextos. Assim sendo, ao observar que a Constituição Federal atribuiu caráter concorrente à competência para legislar em matéria ambiental, podemos inferir que aos Entes federativos restaram dois caminhos possíveis a trilhar: a competição legislativa ou a cooperação legislativa. A escolha, indubitavelmente, foi pela primeira definição.
Embora o aperfeiçoamento da Carta Magna pudesse evitar uma série de decisões conflitantes, a ausência de uma norma geral que defina parâmetros claros para o licenciamento ambiental é a principal causa para a discricionariedade administrativa insana que foi produzida ao longo do tempo e que nos acostumamos a observar estupefatos.
O instrumento que deveria se pautar pela defesa do meio ambiente equilibrado, em nome de uma busca ineficaz por mitigação de externalidades sociais negativas, desvinculou-se do seu objetivo principal, e hoje é o maior entrave para a própria preservação.
Engana-se quem pensa que a burocracia melhora a imagem conservacionista, se assim fosse, o Brasil, terra das normas ambientais mais complexas do mundo, seria o país com os esforços de preservação melhor reconhecidos, o que sabemos não acontece na prática. Dado que confirma essa assertiva vem do Relatório de Competitividade do Banco Mundial (Doing Business 2020), no quesito “alvarás e licenças”, o Brasil está na posição de número 170, dentre as 190 nações ranqueadas. Na mesma métrica, o país figura como mais burocrático que outros 141, e seus processos só não são mais lentos do que os realizados em países como: Camboja, Chipre, Venezuela e Barbados.
A inexistência de uma lei geral de licenciamento fez com que a defesa do nosso meio ambiente ficasse ancorada no princípio da precaução – in dubio pro natura, ou seja, na dúvida o interesse da natureza deve ser preservado. Todavia, a dúvida virou regra e a regra desprezou o fato de que o ser humano faz parte da natureza, abandonando à própria sorte especialmente a parcela da sociedade que não reside nos grandes centros.
Rodovias que já comportam alto fluxo de veículos ficam anos à espera de licenças para pavimentação. Atividades agrícolas, cujos insumos passam por um longo processo de registro após análise agronômica, toxicológica, ecotoxicológica, física, química e de degradação, ao final precisam de um “papel carimbado” que assinala simplesmente as mesmas obrigações definidas em lei. Obras de infraestrutura chegam a gastar mais de 25% do orçamento do projeto com ações sociais, em geral debilidades estruturais que em nada tem a ver com o empreendimento em apreciação, afugentando investimentos e onerando os próprios consumidores. Quem, além daqueles que se beneficiam desse cipoal, têm coragem de defender o atual modelo de licenciamento ambiental do Brasil?
Decerto devemos evitar a frenesi desenvolvimentista nos moldes adotados pelos países de primeiro mundo, mas não podemos também deixar que o debate seja analisado exclusivamente pela caolha perspectiva ideológica. Nesse sentido, o Projeto de Lei 2.159 de 2021, Nova Lei Geral do Licenciamento Ambiental, endereça corretamente os principais gargalos que hoje dificultam o crescimento sustentável do país. O Brasil precisa de licença para crescer, a sociedade só tem a ganhar.
* Fernando Cadore é produtor rural, engenheiro agrônomo e presidente da Aprosoja Mato Grosso.