Por que amar a vacina e odiar o transgênico? - Summit Agro

Por que amar a vacina e odiar o transgênico?

2 de fevereiro de 2021 5 mins. de leitura

A mesma tecnologia aplaudida no caso das vacinas contra o coronavírus é rechaçada quando se trata de agricultura

Publicidade

Por Camila Telles*

Conheça o mais relevante evento sobre agronegócio do País

Estamos passando pela maior crise sanitária, econômica e humanitária dos últimos cem anos. A pandemia do corona vírus está gerando uma verdadeira corrida para encontrar uma vacina que seja eficaz para controlar essa situação urgente. O que poucos sabem é que a tecnologia utilizada para ter essa grande descoberta já é utilizada há anos na agricultura. E ela se chama biotecnologia.

A pesquisadora da Embrapa, Dra. Maria Thereza Macedo Pedroso, explica: “Biotecnologia é atualmente um vasto campo científico, incluindo inúmeras e complexas subespecialidades, as quais contribuem, cada vez mais amplamente, para a melhoria da qualidade de vida da humanidade. É o resultado de uma longa evolução técnica, mas sua rápida expansão ocorreu, sobretudo, na década de 1980. Graças a esse avanço, é possível desenvolver plantas transgênicas com maior resistência às secas, alagamentos, doenças e pragas”. 

Ainda segundo a Embrapa, a transgenia nada mais é do que uma evolução do melhoramento genético convencional, já que permite transferir características de interesse agronômico entre espécies diferentes. Isso quer dizer que essa tecnologia permite aos cientistas isolarem genes de microrganismos, por exemplo, e transferi-los para plantas, com o objetivo de torná-las resistentes a doenças ou mais nutritivas, entre outras inúmeras aplicações.

Transgênico é sinônimo para a expressão “Organismo Geneticamente Modificado” (OGM). É um organismo que recebeu um gene de outro organismo doador. Esta alteração no seu DNA permite que mostre uma característica que não tinha antes. Na natureza, as alterações sempre ocorreram (e ainda ocorrem) e são chamadas de mutações naturais.

Mais de 90% da soja plantada no Brasil é transgênica, mas a tecnologia não é bem aceita por boa parte do público urbano (Foto: Getty Images)

Os genes contêm as informações que definem as características naturais dos organismos, como a cor dos olhos de uma pessoa ou o perfume de uma flor. Ao receber um ou mais genes de outro organismo, um vegetal pode se tornar resistente a pragas ou mais nutritivo, por exemplo.

E nas pandemias?

Quando se pensa no combate às pandemias, a primeira e uma das mais importantes ações é o diagnóstico rápido. Por isso a biotecnologia é inserida para detectar doenças, e logo, remédios e vacinas. 

Com certeza vocês conhecem a insulina. Pois bem, a insulina, hormônio produzido no pâncreas e utilizado no tratamento de diabetes também é produzida por bactérias modificadas. A bactéria recebe o gene responsável pela produção da insulina em humanos e começa a produzir o hormônio, salvando milhões de vidas anualmente. E ela é TRANSGÊNICA!  

Conseguem entender por que não faz sentido ser contra o transgênico e a favor da vacina?

Por qual motivo a biotecnologia é “ferramenta do demônio” quando aplicada na agronomia, mas é “do bem”, quando se trata de medicina. Em ambos os casos, se trata de salvar vidas, seja por nutrição adequada ou por terapêuticas.

Uma das vacinas mais promissoras e aguardada é a de Oxford, que foi desenvolvida com o mesmo tipo de tecnologia utilizada na agricultura: a transgenia. 

E como a Universidade de Oxford, em parceria com a Fiocruz, conseguiu desenvolver uma vacina em apenas 10 meses, se antes era preciso anos para conseguir? Simples, por meio da transgenia e da biotecnologia. A peça central de seu plano era um estilo revolucionário de vacina conhecido como “plug and play”, que possui duas características extremamente necessárias em um momento de tamanha urgência: rapidez e flexibilidade. As vacinas convencionais, incluindo todo o programa de imunização infantil, usam uma forma morta ou enfraquecida da infecção original, ou injetam fragmentos dela no corpo. Mas eles demoram a se desenvolver. 

Em vez disso, os pesquisadores de Oxford construíram o ChAdOx1 – ou Chimpanzee Adenovirus Oxford One. Os cientistas pegaram um vírus do resfriado comum que infectou chimpanzés e o desenvolveram para se tornar o bloco de construção de uma vacina contra quase tudo. 

Antes da Covid-19, 330 pessoas haviam recebido vacinas baseadas em ChAdOx1 para doenças que vão desde uma gripe, passando pelo vírus Zika, pelo câncer de próstata até a doença tropical chikungunya. O vírus dos chimpanzés é geneticamente modificado, ou seja, transgênico, para não causar infecção nas pessoas. E pode ser modificado quantas vezes forem necessárias para treinar o sistema imunológico a atacar praticamente tudo. 

Este alvo é conhecido como um antígeno. ChAdOx1 é, em essência, um carteiro sofisticado e microscópico. Tudo o que os cientistas precisam fazer é mudar o pacote. Claro que todas as vacinas precisam passar por testes clínicos e pré-clínicos antes de serem fornecidas à população. E ela passou por vários testes aqui no Brasil até poder ser disponibilizada para a população. A Comissão Técnica Nacional em Biossegurança (CTNBio), do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), assegura que os organismos geneticamente modificados (OGMs), são seguros, como é o caso dos imunizantes. 

O que importa é a segurança! E assim como na medicina, a agricultura se preocupa muito com isso. 

*Camila Telles é produtora rural, empresária, comunicadora e defensora do agro brasileiro. Formada em Relações Públicas com especialização em Marketing Estratégico, seus vídeos nas redes sociais têm mais de 1 milhão de visualizações, atingindo também o público que não tem convívio com o setor.

Nota: Este texto não, necessariamente, reflete a opinião do Estadão.

Webstories