José Luiz Tejon Megido comenta sobre culpas no agronegócio, principalmente durante a pandemia de covid-19
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Por José Luiz Tejon Megido*
A culpa é dos outros. Vinte gestores de fundos financeiros enviaram uma carta ao embaixador brasileiro em Londres com uma bronca no comportamento do Brasil a respeito do meio ambiente. Em seguida dois presidentes dos dois maiores bancos brasileiros comentam e acrescentam conselhos para tomarmos juízo.
Em paralelo, abaixo-assinado na Europa exige que os supermercados não comprem produtos do Brasil por causa do desmatamento. A China agora amplia consideravelmente os rigores sanitários de todos os fornecedores de carne em função da covid-19. Um grande cliente da Cargill da Noruega não quer mais receber ração oriunda do Brasil.
Os brasileiros estão proibidos de entrar na Europa em função da contaminação. Maçãs brasileiras são também boicotadas em supermercados europeus e precisam buscar mercados menos exigentes como Rússia, Índia e Bangladesh, apenas mais um exemplozinho da “AGRIwar” mundial.
E de quem é a culpa de tudo isso? Deles, dizem muitos. Culpa dos chineses. Culpa das ONGs. Culpa do protecionismo. Culpa da pandemia. E outros ainda atribuem a isso tudo culpa dos “ímpios” infiéis e pecadores perante Deus (qual Deus? O deles contra os outros), ainda tem a culpa dos “comunistas”, dos globalistas, dos pacifistas e os mais diversos “istas” imagináveis. E o pior “a culpa é do outro elo da cadeia produtiva que é a culpada pela minha infelicidade”, quando o fundamento do que significa agronegócio é a gestão da cadeia produtiva como um todo.
Assistimos uma enxurrada de vitimizações e de autovitimizações. Sempre há um “outro” culpado, responsável pelo infortúnio de outros e isso virou moda no Brasil. Basta acompanhar a jornada autovitimizante dos últimos presidentes da república e muitos de seus ministros, sem esquecer também de muitos líderes da sociedade empresarial e demais segmentos.
No contexto do agronegócio, o assunto amazônico é antigo e me recordo de conversas ainda no início dos anos 1980, ao lado do saudoso Ney Bittencourt de Araújo, o responsável pela introdução do conceito de agronegócio no Brasil, que dizia: “problema das invasões, grilagem, na Amazônia é uma questão de aplicação da lei”. Qual lei? A lei que sempre existiu contra o crime.
A insegurança que o Brasil transmite para o mundo reside numa incompetência histórica de comunicação, onde nunca soubemos transmitir as forças, os fatos e feitos do país, que os tem em imensa maioria aos mal feitos, para a sociedade mundial.
Temos hoje uma infelicidade adicional quando misturamos ideologias e visões místicas políticas com os negócios brasileiros e o agronegócio que significa 23% do PIB, pelas contas do Cepea (considero importante rever esses números, para mim 1/3 do PIB). Mas sejam os 23% que impacta direta e indiretamente outros tantos, fazer burrada no discurso de vendas do que produzimos no Brasil deveria haver punição de “lesa-Pátria” minimamente.
Face esses discursos de ataques a povos, países, setores, que são grandes clientes do país, precisamos assistir a ministra da agricultura Tereza Cristina, num esforço espetacular abrindo mercados, sendo uma vendedora dizer: “nosso negócio no agronegócio é vender para quem quer comprar”. E da mesma forma ouvir do CEO da cargill, Paulo Sousa, que sozinha vende cerca de 11 milhões de toneladas de soja do Brasil, para “parar de falar mal dos clientes”.
Sinais importantes de mudanças temos na união das maiores corporações do agronegócio mundial, do pós-porteira das fazendas, não mais investirem publicitariamente em redes sociais onde o ódio, o bullying, o fake news estejam presentes adoecendo corações e mentes.
Mas tudo e qualquer coisa se transforma no país em síndrome de vitimização. A autovitimizacao toma conta dos discursos de grande parte das elites e das lideranças do Brasil. Estão sempre acuados e perseguidos. Alguns por agentes da vida real, e outros por fantasmas inventados e criados para assustar as criancinhas que precisam ser obedientes para afastar o bicho papão de cima do telhado.
Cabe somente a sociedade brasileira a responsabilidade pelos efeitos percebidos nas demais sociedades. Cabe exclusivamente a liderança do país o sentido de encorajamento ou de covardia vitimizadora de um povo. Cabe exclusivamente à liderança do agribusiness brasileiro responder, comunicar, autocriticar, proteger seus produtores rurais, o elo mais exposto aos fatores incontroláveis dentre todos, e combater incansavelmente o crime, e os desonestos. Hora de uma autorregulamentação e código de ética. O mundo pós-covid-19 já está em mudanças: o capitalismo consciente e de responsabilidade, com o cooperativismo, se fará mais evidente. Assumir a direção pelos próprios destinos de uma nação não permite a vitimização e procurar culpados no outro nos outros. Nunca esquecendo que quando apontamos o dedo indicador para o outro, três outros dedos apontam para nós.
“Stop victimization lets Overcome Brazil.”
O agronegócio brasileiro não tem o direito de culpar ninguém. Esse é o fundamento vital de liderança de verdade. Vitimização é o mal nacional. Responsabilidade total e gestão da percepção do agro brasileiro é coisa nossa, de mais ninguém.
*José Luiz Tejon Megido é doutor em Educação, mestre em Arte, Cultura e Educação pela Universidade Mackenzie; professor de MBA na Audencia Business School, em Nantes, na França; coordenador do Agribusiness Center da FECAP; membro do Conselho da Secretaria de Justiça e Cidadania do Estado de São Paulo, e sócio-diretor da Biomarketing