Por Ricardo Santin*
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O clérigo Charles Caleb Colton disse, certa vez, que “má informação é mais desesperadora que a não-informação”. E quando a não-informação favorece a circulação da má – ou incorreta – informação? É quando nasce a má especulação. Não aquela baseada em projeções futuras com base em dados confiáveis. Me refiro à criação de falsas verdades, que geram insegurança, apostas arriscadas, inflação, preços abusivos e prejudicam milhões de pessoas.
Na economia de mercado, especular é um movimento comum. É a aposta em um fim baseado em números, projeções e outros fatores, como o nervosismo do mercado. Entretanto, quando esse sentimento é impulsionado, o estrago pode ser grande. Vejam o cenário que os produtores de aves e suínos têm enfrentado nos últimos meses.
Em plena crise pandêmica, com quadro delicado econômico e as incertezas com o fim do auxílio emergencial, quem produz proteína animal se depara com altas de mais de 100% nos preços do milho e do farelo de soja. Juntos, os dois insumos representam aproximadamente 70% dos custos de produção da avicultura e da suinocultura.
Essa é uma conta que impactará o consumidor e o país. No mercado interno, o inevitável repasse de custos, que tem elevado os preços dos produtos nas gôndolas. Para o mercado exterior, poderemos sofrer uma severa perda de competitividade, justamente quando os mercados internacionais estarão retomando suas atividades, com a esperada superação da pandemia.
O panorama pode ser ainda mais nocivo: com insumos tão caros, ficará praticamente inviável sustentar animais com menores índices de produtividade no campo. A consequência imediata e natural pode eventualmente ser a redução do alojamento dessas aves, o que poderá acarretar a diminuição da oferta de produtos.
Tudo isso baseado na projeção de que falta grãos no mercado interno. O fato, porém, foi refutado pela ministra da Agricultura, Tereza Cristina, em um encontro com o setor produtivo de aves, ovos e suínos. Conforme os levantamentos da pasta, há grãos suficientes para o abastecimento no mercado interno. Isso nos leva à inevitável conclusão de que especuladores com grãos em estoque estão retendo a circulação desses insumos, forçando altas artificiais.
Esse é um quadro que se fortalece na ausência de informações claras sobre os embarques internacionais. A produção nesta safra é superior em relação ao ano passado. Ao mesmo tempo, temos exportações menores, segundo o mesmo período comparativo.
Então, o que sustenta essas altas? Alguns analistas colocam expectativas de efeitos da La Niña sobre o desempenho da próxima safra. A maior tensão vem, entretanto, das supostas compras futuras de insumos pelo mercado internacional, fato ainda não concretizado, conforme indicam as estatísticas.
Mas não há dados transparentes sobre essas compras. No Brasil, não há monitoramento oficial sobre as exportações futuras – um farol básico para a navegação. Algo diferente do que acontece com os Estados Unidos, outro grande produtor mundial de grãos, e que concorre diretamente conosco em carne de frango e suína. Por lá, toda venda internacional é registrada pelo governo.
O registro das vendas internacionais não gera qualquer entrave aos produtores de grãos de lá — prova disso é que os norte-americanos são os grandes concorrentes dos grãos brasileiros. Mas, a quem produz proteína animal, que agrega valor para o país, é uma ferramenta de previsibilidade e transparência valiosa, dando uma visão mais precisa sobre o quadro de abastecimento desses insumos estratégicos.
A realização do monitoramento destas vendas futuras foi solicitada pela Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA) ao Ministério da Agricultura. É uma demanda que vai além da equivalência competitiva com nossos concorrentes. Tem impacto direto, também, na inflação dos alimentos para a população brasileira. Sem dados, a especulação ganha força, a má informação se expande, a produção de alimentos enfraquece, e o Brasil perde.
*Ricardo Santin é presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA).
Nota: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Estadão.