Por Maurício Palma Nogueira
Na primeira semana deste mês de junho, a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (Abiec), com apoio da ApexBrasil, divulgou o relatório do movimento da cadeia produtiva da pecuária de corte em 2021. De acordo com o estudo, o setor movimentou R$ 913,14 bilhões em 2021, um aumento real de 14,9% sobre 2020. Segundo dados do Cepea/Esalq e IBGE, o PIB do agronegócio e do Brasil no mesmo período aumentaram, respectivamente, 8,4% e 4,6%.
No caso da pecuária, o movimento divulgado pelo relatório da Abiec é maior do que o divulgado pelo Cepea. Como se trata de uma metodologia acadêmica, o Cepea precisa envolver apenas a produção formal e as receitas diretamente relacionadas aos setores anteriores e posteriores à cadeia produtiva.
Essa diferença, portanto, não é explicada por eventuais contradições, mas sim por critérios metodológicos. O estudo divulgado pela Abiec inclui diversas variáveis que não entram na metodologia do Cepea que, além da pecuária de corte, precisa estudar diversas outras cadeias produtivas aplicando a mesma metodologia. Portanto, são números que não devem ser comparados entre si.
Com cerca de R$245 bilhões, o faturamento nas fazendas de pecuária representou 27% do total movimentado pelo setor, aponta o relatório da Abiec. As vendas de animais para abate totalizaram R$ 192 bilhões em 2021. Comparando todo o movimento, é possível concluir que cada R$ 1 faturado com a venda de animais para abate acabou movimentando R$ 3,7 em outro ponto da cadeia produtiva, da produção e transporte de insumos até o movimento nas gôndolas dos supermercados.
Essa relação entre movimento na cadeia produtiva e o faturamento da pecuária atingiu R$ 6 em anos anteriores. A queda atual é explicada pelo cenário que a pecuária vem vivendo. Queda na produção e elevação nos preços do campo aumentam os preços nas fazendas o que, em última instância, explica a alta nos preços da carne nas gôndolas. Em valores nominais, o aumento percentual do faturamento das fazendas foi de 42%, enquanto o PIB total aumentou 27%. A análise nominal é referente ao movimento financeiro do período, não considerando o efeito da inflação (análise em valores reais).
Se há falta de produto no curto prazo, há também o estímulo para o aumento de produção nas fazendas, o que vem sendo observado por meio de diversos indicadores. Ainda que os custos de produção tenham se elevado, as fazendas mais tecnificadas tendem a acelerar o processo de aumento na produção. Nos próximos anos, a tendência é que mais recursos sejam direcionados ao setor de insumos, serviços e empregos nas unidades de produção. O efeito de todo movimento tende a gerar maior faturamento nas indústrias frigoríficas, setores correlacionados (couro, sebo e demais subprodutos) e no varejo. Consequentemente, a relação entre o movimento financeiro da cadeia produtiva e o faturamento nas fazendas voltará a aumentar.
A importância de se levar tais informações e relações em consideração é compreender o impacto de uma cadeia produtiva para a economia como um todo. Dentro do movimento do setor, cerca de R$ 65 bilhões foram pagos em salários e encargos trabalhistas, somando fazendas, indústrias e varejo. Aplicando indicadores de estudos acadêmicos, é possível estimar ainda que o setor gerou outros R$ 44 bilhões em salários pagos indiretamente ou por efeito renda. O impacto positivo tende a aumentar à medida que aumenta o aporte tecnológico na produção de gado.
Dentre as diversas estatísticas apresentadas no relatório, o estudo conclui que 26% do total de bovinos abatidos em 2021 não tenha passado por fiscalização. Esse total representa 23% da produção de carne. Importante lembrar que o número também considera os bovinos abatidos para consumo nas próprias fazendas, que somam cerca de 4 milhões de animais. Nesse caso, o abate não representa riscos à população e nem sonegação fiscal, visto que produtos e subprodutos não são destinados ao comércio, exceção às raras atividades artesanais – quando comparadas ao tamanho da pecuária brasileira – ainda conduzidas pelo interior do Brasil.
Pelo sistema de fiscalização federal (SIF), o mais rigoroso de todos, passaram 53% dos animais abatidos, que representam 59% do total da carne produzida no Brasil. Em 2021, segundo conclusões apresentadas no relatório, foram abatidas 39,15 milhões de cabeças, que produziram 9,71 milhões de toneladas de carne. Foi a menor quantidade de animais abatidos desde 2012, o que explica a alta de preços no mercado de carne. A estimativa é que o abate e, consequentemente, a produção voltem a aumentar a partir de 2022.
O relatório é aberto ao público e pode ser acessado através da página da Abiec.
Maurício Palma Nogueira é engenheiro agrônomo, diretor da Athenagro e coordenador do Rally da Pecuária