Por Maurício Palma Nogueira
A atual facilidade com que informações e dados são acessados traz uma falsa sensação de conhecimento. O ser humano está diante de uma mudança para a qual ninguém foi preparado. Aprenderemos com o tempo.
Há duas décadas, esse cenário foi previsto pela World Future Society (entidade que estuda tendências do futuro). Segundo a entidade, no início do século 21, a massa de conhecimento disponível no mundo dobrava a cada dois anos. Essa dinâmica ocorria pela quantidade de produção científica global por meio de pesquisas, experimentos, teses, estudos, produtos etc.
Na virada do milênio, acreditava-se que 90% dos cientistas que já passaram pela Terra, ainda estavam vivos e produzindo. O número de cientistas em atividade era tão grande a ponto de colocar nomes como Aristóteles, Arquimedes, Pitágoras, Gallileu Gallilei, Copérnico, Isaac Newton, Lavoisier, Pasteur, Albert Einstein e inúmeros outros entre apenas 10% do total que já produziram inovações para a humanidade.
A mesma entidade estimava que as mudanças observadas entre 1980 e 2000 seriam o equivalente a apenas 10% do que ocorreria entre 2000 e 2020.
O resultado está aí: dificuldade em gerenciar a quantidade de informações e dados apresentados de forma descontextualizada e desconexa.
A partir de fragmentos de informações e correlação de dados sem o devido estudo de causa e efeito, pesquisadores, leigos em outros temas, divulgam conclusões precipitadas e equivocadas. Com isso, a produção científica acaba sendo contaminada por premissas equivocadas ou dados pouco aprofundados. Chega-se ao ponto de surgirem estudos sobre produção de carne sem o cuidado básico de transformar número de animais em quantidade de carne produzida.
É fundamental compreender que, apesar do acesso e da incrível disponibilidade de dados e informações, o conhecimento ainda é construído a partir de leituras densas e frequentes. As disciplinas são interligadas, o que exige o estudo de vários temas relacionados. O processo de aprendizado envolve compreender a interação entre as diversas variáveis e voltar frequentemente aos estudos.
Com tanta produção científica, é de se imaginar que o conhecimento pleno sobre determinados assuntos esteja cada vez mais restrito a especialistas. É por essa razão que a discussão de temas específicos demanda o envolvimento de equipes multidisciplinares.
Por negligenciar essa realidade, uma grande instituição financeira privada do Brasil se envolveu em um enorme constrangimento nos últimos dias de 2021. A partir de informações superficiais e mal interpretadas, o banco acabou embarcando em uma campanha equivocada, o que gerou forte reação do setor produtivo.
A peça publicitária atribuía ao consumo de carne bovina um problema ambiental que não existe. Por mais que a competente máquina de comunicação continue divulgando a falsa relação entre o consumo de carne e problemas ambientais, a realidade não mudará pelo excesso de mentiras.
O banco em questão errou ao embarcar em um modismo que muitas vezes é endossado até por pesquisadores que se aventuram a discorrer sobre assuntos que não compreendem.
Se fossem mais cautelosos, poderiam ter feito uma campanha mais inteligente, agradável e propositiva. Estimular o consumo de carne fiscalizada, por exemplo, garantirá que aquela produção não venha de desmatamento ilegal.
Poderia trazer informações sobre como é a distribuição da produção de carne por faixa de produtores e quais os reais desafios da sociedade para conter o desmatamento ilegal. Explorar os avanços tecnológicos dos últimos anos e a capacidade do brasileiro em atender a demanda mundial crescente por carne. Poderia, inclusive, mostrar o papel fundamental da instituição nesse processo de tecnificação.
E o ganho não foi pouco. Segundo números oficiais do IBGE, em 32 anos, o rebanho aumentou 12,8%, enquanto a produção de carne foi acrescida em 108,4%. A produtividade por área de pastagens, que recuou 15,8%, aumentou 147,4%% no período.
Não seria melhor esclarecer e tranquilizar o consumidor em relação ao consumo de um dos produtos preferidos pelo brasileiro, ao invés de investir em uma calculadora superficial para avaliar as pegadas de carbono?
Ingenuamente, uma organização exemplar com uma invejável trajetória de sucesso foi manipulada ao endossar uma mensagem que atende uma determinada agenda de engajados.
O excesso de informações – e de opiniões de falsos especialistas – tem sido extremamente eficiente na manipulação do conhecimento.
As grandes corporações precisam aprender com o exemplo e redobrar sua atenção. O caso do banco não foi o primeiro e nem será o último.
Maurício Palma Nogueira é engenheiro agrônomo, diretor da Athenagro e coordenador do Rally da Pecuária