Depois da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP-27), realizada em Sharm El-Sheikh, no Egito, diversas análises circularam pela imprensa internacional destacando os desafios pela frente, que não são poucos. Em grande parte das publicações, ficou a sensação de frustração em relação aos avanços discutidos durante a COP-27. Houve até quem falasse em retrocesso.
O sentimento pode ser explicado pelo momento que o mundo vive. Depois de vários acontecimentos negativos, os desafios dos próximos anos parecem ter ficado ainda maiores. Fazendo uma analogia grosseira, é como se olhássemos os problemas de joelhos ao invés de estarmos em pé. Naturalmente, todos os desafios parecerão maiores.
Outra questão que pode ter influenciado é a dificuldade de colocar em execução as diversas medidas que já se sabem necessárias. Mais uma vez, essa dificuldade é agravada pelo cenário global que sinaliza anos complicados pela frente.
Compilando dados do FMI, FAO, USDA e IBGE, as perspectivas para os próximos anos evidenciam que a economia continuará inflacionada. No caso das proteínas, por exemplo, a tendência é de que a disponibilidade per capita global da soma das carnes bovinas, suína e de aves aumente 4,5% entre 2021 e 2025. A renda per capita no mesmo período aumentará quase 20%.
Sendo assim, a necessidade de aceleração das cadeias de produção é evidente, o que amplia o desafio em torno do controle das emissões de carbono, visto que as emissões tendem a aumentar juntamente com o crescimento das atividades econômicas. Essa máxima é uma realidade na produção de alimentos com base nos sistemas de produção dos países mais ricos do mundo, todos de clima temperado.
É aí que entra a importância do conhecimento acumulado aqui no Brasil, único país a dominar a tecnologia de produção agropecuária de alto desempenho em ambiente tropical. Ao contrário do que ocorre nos demais países do mundo, a produção brasileira vem sendo extremamente eficiente em aumentar a produção mitigando as emissões de carbono.
Entre os anos de 1990 e 2022, o rendimento médio de cada hectare em produção no Brasil melhorou 265%, saltando de 1,37 tonelada por hectare para 5,02 toneladas por hectare de produtos gerados pela produção agropecuária. O cálculo envolve todos os produtos de origem vegetal e animal obtidos a partir das atividades agropecuárias. Em três décadas, a produção brasileira aumentou 250% em uma área 4% menor.
O conceito por trás deste avanço é de difícil compreensão para aqueles que não estudaram ciências agronômicas e todas as disciplinas envolvidas. Mas para simplificar o raciocínio, é possível afirmar que o aumento na produtividade observada no Brasil não seria possível sem que houvesse construção da fertilidade do solo. Junto com o avanço genético dos cultivares, e dos pacotes tecnológicos disponíveis, preparar o solo para as plantas desempenharem seu potencial a campo foi determinante para atingir essa evolução.
Neste momento entram os conceitos agronômicos na condução deste processo. Só é possível melhorar a fertilidade a partir do investimento nas características físicas e químicas do solo. E esse investimento depende do manejo do sistema de produção de forma a aumentar a quantidade de carbono retida na área. O plantio direto é um exemplo na agricultura, assim como ocorre com a integração entre lavoura e pecuária e a intensificação da produção das pastagens através de correção, adubação e tratos culturais.
Um olhar mais atento levará à percepção de outro benefício. Tanto na agricultura, com o plantio direto, como nas pastagens com a intensificação da área, as operações agrícolas de alta demanda por combustíveis estão sendo substituídas por operações mais eficientes em termos de custo energético por área. Em ambos os casos, os sistemas de produção irão substituir as arações e gradagens por distribuição de fertilizantes e aplicação de defensivos na área. A mesma quantidade de óleo diesel é suficiente para cobrir uma área maior.
Sendo assim, além da remoção de carbono a partir da construção da fertilidade do solo, a alteração dos sistemas de produção no Brasil possibilitará reduzir as emissões de carbono por unidade produzida. Na última edição do Rally da Pecuária, foi estimado o ganho que ocorre em redução nas emissões de carbono em sistemas mais otimizados. Entre o público que responde os questionários da expedição técnica, as emissões médias de equivalente gás carbônico por quilograma de carcaça são 45% inferiores às emissões médias estimadas para a pecuária brasileira. A produtividade deste público é cerca de 2,3 vezes maior do que a produtividade média da pecuária brasileira. E, mesmo assim, essa média ainda está longe do potencial observado entre os mais produtivos dessa amostra. As oportunidades são enormes.
A produção agropecuária brasileira tem muito a ensinar. Melhor ainda! O que os brasileiros têm a ensinar ajudaria países pobres a melhorar a qualidade de vida. É a sustentabilidade na sua definição completa: economia, ambiente e sociedade.
Para que as discussões comecem a gerar ações globais mais práticas, é fundamental envolver pesquisadores e especialistas em produção tropical nas próximas edições das conferências do clima.
Cientistas leigos na área da agropecuária estão insistentemente procurando soluções para problemas já resolvidos. Sem inclusão científica, as próximas conferências continuarão sendo eficazes apenas em dimensionar problemas sem apresentar ações factíveis para solucioná-los.
Interessa a alguém?
Maurício Palma Nogueira é engenheiro agrônomo, diretor da Athenagro e coordenador do Rally da Pecuária