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Quem vai educar o consumidor sobre ciência nos alimentos: o desafio do “gene ao meme”

A profª dra. Gervaise Debucquet, da Audencia Business School de Nantes, na França, em um master science com diplomação dupla com a Fecap, São Paulo, apresentava para mais de cem jovens o seminário “Os desafios das novas tecnologias no agronegócio, o caso da engenharia genética”. E mostrou a seguinte pergunta feita junto a consumidores franceses: “O tomate que nossos avós plantavam e colhiam no fundo do quintal tinha ‘genes’?”. Qual a resposta? 60% disseram: NÃO.

Esse pequeno exemplo serve para demonstrar a imensa distância que separa o nível de educação dos consumidores de alimentos para uma consciência sobre a ciência já existente e cada vez mais presente nos alimentos.

A pesquisa da profª Gervaise revelou também que quanto mais se tenta informar sobre, por exemplo, transgênia, ou edição genica, a coisa não melhora.

O assunto da engenharia genética é visto como positivo quando relacionado ao tratamento e prevenção da saúde humana como doenças. Mas quando colocado no campo da alimentação surgem fortes aspectos culturais de rejeição como:

1 – comida artificial

2 – sem sabor

3 – não tem cultura do “terroir”

4 – comida “clone”

5 – perda da ancestralidade

6 – potencial de efeitos desconhecidos

7- riscos sobre a diversidade

Neste aspecto de perder a origem antiga da cultura, do terroir, discutimos se a difusão, o apoio e a divulgação com suporte de um Cenargen, um centro nacional de recursos genéticos, como temos na Embrapa, o quarto maior do mundo, por exemplo, se isso não funcionaria como um ótimo ponto de conexão com a sociedade neste aspecto de não estarmos perdendo o “natural dos ancestrais”. Nos parece um caminho positivo para a comunicação das inovações genéticas, assegurando a preservação dos materiais antigos num banco de sementes, por exemplo.

Com relação à edição gênica, há por parte dos cidadãos franceses uma melhor aceitação do que na transgênia. Na pesquisa apresentada com a maçã, ocorre menos resistência com a edição. Porém, mesmo assim, 52% responderam “não é natural”.

Mesmo quando são apresentadas evidências de que não ocorreram problemas com a saúde humana ou dos animais com o consumo de gmo, ou editados, existem desconfianças alegando que “o tempo irá mostrar”.

A pesquisa aponta diferença entre pessoas que usam uma lógica naturalista comparado aos que tem a lógica cartesiana.

Os naturalistas consideram as intervenções genéticas como um “eugenismo”, risco total sobre a natureza.

Os cartesianos entendem que a intervenção pode ser positiva aumentando o controle sobre os fatores incontroláveis na produção de alimentos.

A conclusão desse seminário, dentro do FAM, FOOD & Agribusiness Management, onde procuramos formar ACO’s, agribusiness chief officers, está na necessidade das corporações e entidades envolvidas no desenvolvimento científico da genética com a qualidade e a segurança dos alimentos investirem em campanhas educativas de longo prazo, educando para a ciência como fator racional cada vez mais fundamental no desafio de produzir e alimentar toda a humanidade.

Mostrar o progresso e os benefícios das intervenções genéticas no campo da saúde humana e na mitigação do sofrimento das pessoas pode ser um ótimo caminho comparativo.

Da mesma forma, associar a evolução do melhoramento genético das cadeias vegetais, animais, energéticas, fibras, florestais, com as estratégias ESG é um movimento estratégico essencial e os vincular de maneira positiva também no tópico das mudanças climáticas e descarbonização.

No item responsabilidade social, incluir milhões de pequenos produtores rurais na produção com renda acessível será vital para a luta anti-insegurança alimentar de bilhões de pessoas na terra, onde a ciência genética poderá ampliar os efeitos nutricionais associados ao prazer sensorial de menos volumes com muito mais nutrição.

E, sem duvida, é necessária comunicação educativa para todos os stakeholders estejam eles no antes, dentro ou pós-porteira das fazendas.

Da gôndola de um supermercado, no fast food, no quilo, nos nutrólogos, na mídia e na medicina, cruzando pelo feirante, produtores rurais, serviços financeiros, cooperativas e distribuidores de tecnologia para o campo, chegando à mente do pesquisador biólogo geneticista, é necessário diminuir o gap que nos distancia do “gene ao meme”.

Será preciso dialogar com os diferentes, trazendo para a mesa ONGs, associações de defesa dos consumidores, religiosos, legisladores, jornalistas, ativistas, educadores, artistas etc.

Afinal, como nos definiu o professor Ray Goldberg, criador do conceito de agribusiness na Universidade de Harvard nos anos 1950, ele me disse agora com mais de 90 anos: “Agribusiness virou sinônimo de saúde, é um health system”.

Comunicação educadora agora do “gene” dos geneticistas ao “meme” dos nossos neurônios como cidadãos do século 21.

(Também participaram da pesquisa os doutores Regis Baron e Mireille Cardinal. Estudo completo publicado no Public Understanding Science – PUS. gdebucquet@audencia.com)

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