Produtores e pesquisadores se voltam a práticas sustentáveis
29 de maio de 2019
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O objetivo é usar práticas conservacionistas e ciência para produzir mais e melhor, aumentar a rentabilidade e gerar menos impactos ao meio ambiente
Controle biológico gera economia
A constatação de que precisava mudar aconteceu há cerca de sete anos e levou a família Ragagnin a buscar outra forma de produzir. A primeira atitude foi adotar o sistema de rotação de culturas e implementar a pecuária. “Se eu tenho um sistema direcionado a lavouras, soja, milho e feijão, e deixo ele um ano voltado à pecuária, e quebro todo o ciclo de doenças sem precisar colocar nada”, diz o gestor de produção da empresa. “E, quando volto à lavoura, eu tenho cultivos mais saudáveis sem precisar interferir muito”, explica Joel. Natural do Rio Grande do Sul, a família Ragagnin está na região de Jataí, em Goiás, desde 1979. Hoje, o Condomínio Ragagnin é uma empresa familiar formada pelos pais e cinco filhos, que juntos cultivam 9,5 mil hectares de soja, milho e feijão. De acordo com o engenheiro agrônomo Joel Ragagnin, responsável pela operação agrícola do Condomínio, a guinada na forma de produzir foi forjada pela necessidade. “Começamos a observar que este sistema de uso de insumos químicos, fertilizantes, fungicidas e inseticidas estava se esgotando”, diz. “Estávamos aumentando o uso, mas não estava sendo suficiente”, explica. LEIA MAIS > Pecuária bovina na berlinda > No caminho da sustentabilidade As mudanças levaram a uma diminuição grande no uso de inseticidas. Aliado a isso, a família adotou o controle biológico, uso de bactérias, fungos e insetos para combater doenças e pragas e também para fixar nutrientes no solo. Paralelamente, os Ragagnin substituíram parte dos fertilizantes químicos – insumo extremamente caro, já que cerca de 90% da matéria-prima é importada – por rochagem. Trata-se da utilização do pó de rochas regionais como adubo nas lavouras. Também conhecido como remineralizador de solo, o produto é ambientalmente correto por ser proveniente de rejeitos da mineração. “Gradualmente, estamos substituindo os fertilizantes químicos por estes alternativos”, diz Joel, que hoje integra o Grupo de Agricultura Sustentável (GAS), que reúne produtores de todo o Brasil.Redução do efeito estufa
Quem diria que a agricultura poderia ajudar na sustentabilidade da geração de energia? Este é o objetivo do AgriCarbono, um projeto da Embrapa Agroenergia que conta com recursos de cerca de R$ 8 milhões provenientes da Eletrobras Companhia de Geração Térmica de Energia Elétrica (CGTEE), por meio do Programa de P&D da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e da Embrapa. “O projeto AgriCarbono consiste na utilização do gás carbônico (CO2), que é gerado pelas termoelétricas da Eletrobras no Rio Grande do Sul para obtenção de produtos químicos de alto valor [e utilidade para a agropecuária]”, explica Silvio Vaz Jr., pesquisador da Embrapa Agroenergia à frente do projeto.“Quando você faz uma liberação controlada [de agroquímicos], a expectativa é reduzir a quantidade aplicada no campo, diminuindo o impacto à saúde pública e ao meio ambiente da utilização do produto”, esclarece Silvio Vaz Jr., pesquisador da Embrapa Agroenergia.Esses “suportes” são feitos com nanocarbonatos e polímeros naturais – como a lignina, subprotudo da indústria de papel e celulose. No caso do AgriCarbono, o alvo da pesquisa para a liberação lenta ou controlada são três classes de agroquímicos: semioquímicos (como o cis-jasmone), antibióticos (a oxitetraciclina) e fertilizantes (o próprio nanocarbonato). “Os semioquímicos são compostos químicos liberados por plantas e insetos como arma de defesa ou para atrair parceiros”, explica o pesquisador. A ideia é usar os suportes para a liberação lenta desta substância, a ser empregada no Manejo Integrado de Pragas (MIP), que consiste em utilizar em regime de alternância produtos biológicos e agroquímicos. Com os antibióticos a lógica é a mesma. A intenção é usar as cápsulas à base de nanocarbonato e lignina para a liberação lenta da oxitetraciclina, um dos fármacos mais usado na pecuária brasileira para tratamento de doenças e ganho de peso. O problema é que de 20% a 90% da substância é excretada pelos animais, o que pode interferir no meio ambiente e criar resistência a certos microrganismos. Por último, o projeto pretende usar o nanocarbonato, que é um sal sólido, como fertilizante em estufas de vegetação para corrigir o solo e a auxiliar na fotossíntese das plantas ali cultivadas, como hortaliças. O AgriCarbono teve seu início este ano e deverá ser concluído daqui a três anos. Ele não contempla os defensivos agrícolas (herbicidas, fungicidas e inseticidas). No entanto, a Embrapa Agroenergia está participando do consórcio internacional de pesquisa GreenMol da União Europeia com o apoio do CNPq – também coordenado por Vaz Jr. –, em que estudará o comportamento de pesticidas como o glifosato (o herbicida mais usado na soja), quando encapsulado pela lignina kraft da indústria de celulose e papel. Para o coordenador do projeto, a agricultura pode contribuir para a sustentabilidade da geração de energia elétrica, enquanto ela própria utiliza produtos de CO2 para ser mais sustentável.