Iniciativa privada impulsiona aumento da conectividade na área rural

30 de junho de 2021 7 mins. de leitura
Empresas fabricantes de máquinas agrícolas se unem a operadoras de telefonia para encontrar soluções de comunicação no interior do País

Em plena pandemia de covid-19, o avanço tecnológico e a conectividade voltam ao centro da discussão no agronegócio. Se por um lado a pandemia acelerou muitos processos, por outro reforçou a necessidade de ampliar a conectividade no campo para automatizar operações e melhorar a produtividade. E o caminho para viabilizar os investimentos necessários, de acordo com participantes de associações e empresas envolvidas na questão, é a integração entre os diferentes agentes do setor, como o governo, empresas privadas e produtores.

O Brasil tem uma média de 23% de conectividade na área rural, utilizando-se do modelo 4G, 3G, ou 2G, conforme o estudo Cenários e Perspectivas da Conectividade para o Agro, elaborado pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP) a pedido do Ministério da Agricultura. Apesar disso, apenas 11% do campo está conectado com a tecnologia considerada adequada, estima Gregory Riordan, diretor de Tecnologias Digitais e de Precision Solutions & Telematics da CNH Industrial para a América do Sul e presidente da ConectarAgro, associação que reúne as fabricantes de máquinas agrícolas AGCO, CNH Industrial e Jacto, além de Climate FieldView (Bayer), Nokia, Solinftec, TIM e Trimble. 

“Ainda existe uma lacuna muito grande, e ao mesmo tempo uma oportunidade para conectar e trazer eficiência para a produção agrícola”, disse ele, acrescentando que a ideia da ConectarAgro é justamente esta: unir os esforços de várias empresas para equilibrar e até equiparar a conectividade do campo à das cidades. Segundo o executivo, o maior desafio não é a tecnologia em si, mas fazê-la acontecer. Nesse sentido, os projetos têm dado tão certo que o grupo vai receber mais de 20 novos membros, cujos nomes ainda não foram divulgados.

Desde o ano passado, quando a ConectarAgro foi criada, mais de 6 milhões de hectares foram conectados na área rural, por meio de 10 grandes projetos, que beneficiaram em torno de 600 mil pessoas, em mais de 50 mil propriedades, além de ter incluído na cobertura cerca de 20 mil quilômetros de área rodoviária, conforme Riordan. A tecnologia utilizada foi o serviço de rede 4G na frequência de 700 MHz, que possui um padrão global e tem a sua manutenção realizada pela própria operadora. “No passado, o que acontecia é que toda solução tinha a sua própria conectividade. Isso era ruim porque trazia custo e complexidade para o produtor operar e fazer uso da rede. Depois de pesquisar, identificamos uma opção que atendia aos critérios dos produtores: uma conectividade aberta, acessível e simples de ser utilizada.”

O modelo de negócios adotado pela associação e viabilizado pela operadora TIM é uma estratégia para atender “cliente a cliente”, com projetos sob demanda e custos da estrutura (não apenas do pacote de dados) arcados por produtores ou empresas. Entre os clientes, estão a Adecoagro, com mais de 600 mil hectares cobertos no Vale do Ivinhema (MS); a Jalles Machado, com um projeto em Goianésia (GO); a Citrosuco, com uma área de 1,9 milhão de hectares no Estado de São Paulo; além da SLC Agrícola, com 22 mil hectares na Bahia, e a Amaggi, na Fazenda Água Quente (MT).

Segundo o diretor de Marketing Corporativo e IoT (Internet das Coisas) da TIM Brasil e líder do projeto 4G TIM no Campo, Alexandre Dal Forno, a solução para avançar na conectividade rural é implementar um modelo diferente do da cidade, já que em algumas regiões mais afastadas a implementação por densidade demográfica acaba não sendo viável.

Embora cada projeto seja direcionado a um cliente, ele explica que “a onda magnética do 4G não obedece a cercas” e os moradores dos arredores acabam sendo beneficiados, com a oportunidade de aproveitar a conectividade da área coberta. E é por meio dessa estratégia que a TIM, com a ConectarAgro, tem a meta de ampliar a cobertura dos 6 milhões de hectares declarados para 13 milhões de hectares até dezembro e, em seguida, para 19 milhões de hectares até o fim de 2022. “É uma tecnologia pública e simples. Eu pego o meu smartphone e não pergunto em qual frequência ele trabalha, boto um chip e ele começa a funcionar”, disse Dal Forno.

“Uma torre de 4G com 700 MHz numa região como a do Matopiba (entre Tocantins, Bahia, Maranhão e Piauí) cobre uma área de mais de 30 mil hectares. Já numa região como o Estado do Paraná, que tem um relevo mais irregular, chega a 10 mil ou 15 mil hectares”, completa o executivo, ao mencionar que cada área de aplicação tem uma abrangência diferente.

O grupo também prevê uma atuação mais direta para os pequenos e médios produtores, e, para isso, a TIM tem ido até as cooperativas, em regiões como Nordeste e Centro-Oeste, mas principalmente no Sul do País e em São Paulo, para desenvolver modelos de investimento mais adequados. “Nós entendemos que, para cobrir e levar conectividade para um produtor de 100 a 200 hectares, por exemplo, tem que ser por meio de um arranjo junto a esses produtores”, disse Dal Forno. Na avaliação dele, “a mudança no mindset dos pequenos produtores vai mudar radicalmente o cenário do País”.

5G em fase de testes

4G TIM no Campo – Fazenda Panorama – SLC Agrícola

Por enquanto, todas as soluções disponíveis para os produtores estão no ambiente 4G, segundo a TIM. Mas a perspectiva é de que o 5G comece a ser utilizado no País em breve. Em maio, a empresa lançou o seu primeiro piloto  5G Standalone (SA) para o agronegócio, em parceria com a Nokia e a Associação Mato-Grossense dos Produtores de Algodão, em evento no Centro de Treinamento e Difusão Tecnológica (Ampa/Ima-MT). O projeto é o segundo piloto em 5G da empresa, de uma série de 20 que o Ministério das Comunicações apresentará até o fim do ano em diferentes áreas, conforme a operadora.

Produtor conectado e capacitado

Além da ConectarAgro, outras entidades e empresas têm se debruçado sobre a perspectiva educacional e profissionalizante. É o caso do Instituto Agrihub, uma agtech criada pelo Sistema Famato (Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Mato Grosso), com a missão de mediar as negociações entre produtores e os setores público e privado, conta o diretor executivo da instituição, Otavio Celidonio. “Nosso trabalho é fazer essa ponte. Acreditamos que agrupar o setor para viabilizar a tecnologia é o grande desafio, porque o avanço da conectividade no campo depende de um valor robusto.”

Na visão dele, o conhecimento fomenta o investimento. E é por isso que um dos projetos que o Agrihub apoia, com a ConectarAgro, é o desenvolvimento de um ensino a distância para o produtor, com conteúdo sobre o uso da tecnologia na gestão das fazendas, contribuindo para um aumento de eficiência e produtividade. Ao mostrar esses benefícios, o executivo acredita que mais produtores vão se interessar pela tecnologia. O que tem ocorrido por enquanto, acrescenta, é um movimento negativo de uma série de produtores quanto ao custo de instalação de torres e antenas, o que acaba atrasando a chegada da cobertura na região, ainda que fazendeiros de propriedades vizinhas estejam dispostos a investir.

 “Quanto mais disseminada a cultura de uso da tecnologia, mais fácil é ter investimento coletivo. A gente enxerga necessidade de capital público apenas para atender a situações de agricultura familiar, cujos produtores não têm condição de arcar. Onde tem maior pujança o setor privado consegue ajudar mais, mas é injusto que uns produtores paguem e outros não”, comenta ele.

Em Mato Grosso, quase todo o Estado já possui sinal de internet na sede das fazendas, mas menos de 5% das áreas produtivas estão cobertas. Segundo Celidonio, para cobrir os 10 milhões de hectares de área produtiva do Estado, seria preciso investir cerca de R$ 200 milhões. Na avaliação de Celidonio, para destravar a tecnologia, faltam esse investimento e a profissionalização dos produtores.

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