Campo eleva produtividade ano a ano, mas custos são desafio

27 de julho de 2022 6 mins. de leitura
Rendimento das lavouras brasileiras aumentou 400% desde 1975, transformando o Brasil em exportador de alimentos

Se há algo em que o agricultor brasileiro se empenhou nas últimas décadas foi no aumento da produtividade de suas lavouras. Graças a isso, se nos anos 1970 o País era importador de alimentos, hoje é um dos principais exportadores globais e, segundo estudo da Embrapa, divulgado em março do ano passado, garante a nutrição de mais de 800 milhões de pessoas no mundo. O avanço não seria possível se o agricultor brasileiro não tivesse investido, ao longo desses anos, em elevar a produtividade, em que pese, porém, o desmatamento para aumento da área plantada, que também ocorreu, embora não na mesma proporção. Levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), feito em parceria com o Ministério da Agricultura (Mapa) e o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea/Esalq-USP), divulgado no início de junho, apurou que a produtividade agrícola brasileira apresentou, de 1975 a 2020, um aumento de 400%.

Outro dado importante do estudo do Ipea, apontado pelo pesquisador José Eustáquio Ribeiro Vieira Filho, é que, no contexto da produção agropecuária nacional, a expansão do capital na forma de máquinas, fertilizantes e defensivos agrícolas tem superado o crescimento dos demais fatores, como terra e mão de obra. “Podemos afirmar que nossa produção é intensiva em ciência e tecnologia e cada vez menos intensiva em fatores tradicionais”, pontuou, no texto do Ipea. “Essa dinâmica resulta em uma enorme ampliação da produtividade do trabalho ao longo do tempo.”

Tal performance ocorreu também na base de crédito e seguro rural, e de corte dos subsídios, avalia o Ipea. “Além disso, tem havido aumento de recursos, com ênfase no crédito de investimento, em linhas de financiamento que atendem aos diferentes portes produtivos, bem como em áreas que estimulam a agricultura de baixo carbono.”

Juros mais altos

Na safra atual, 2022/23, por exemplo, que se iniciou em 1º de julho, foram destinados, para crédito rural, R$ 341 bilhões, 36% mais ante a safra anterior e novo recorde em recursos, que, aliás, é batido ano a ano. Entretanto, conforme observa a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), em nota, os juros deste ano-safra serão bem mais altos em relação aos do ciclo 2021/22, dificultando a obtenção de crédito.

Nas linhas de investimento, citadas pelo Ipea, poucas escaparam de juros de dois dígitos neste Plano Safra. O Moderfrota, principal linha de financiamento de máquinas e implementos agrícolas, contou com recursos de R$ 10,16 bilhões, mas com os juros mais altos entre todas as linhas – 12,5% ao ano. O Proirriga, para estimular o investimento em irrigação, abocanhou recursos de R$ 1,95 bilhão a juros de 10,5% ao ano. Já o Plano ABC, de agricultura de baixo carbono, contou com juros mais suaves, de 7% a 8,5%, e R$ 6,19 bilhões. No Pronaf, programa da agricultura familiar, os recursos somaram R$ 22,6 bilhões, com juros um pouco mais amigáveis, de 5% a 6% ao ano.

Mesmo com taxas de juros desafiadoras, além do aumento do custo de produção, principalmente de fertilizantes e defensivos, há perspectiva de que o produtor até mesmo amplie a área plantada na safra 2022/23. Segundo estimativa do Instituto Mato-Grossense de Economia Agropecuária (Imea), Mato Grosso – o principal produtor de soja do País – deve colher, no ciclo 2022/23, um total de 41,51 milhões de toneladas da oleaginosa, ou 1,62% mais ante 2021/22. A área plantada prevista, de 11,81 milhões de hectares, se traduz pelo “otimismo” dos produtores, que segue firme, “devido à permanência dos altos patamares de preços da oleaginosa e à demanda aquecida”, diz o Imea, em seu boletim. O instituto adverte, porém, que a produtividade da safra, cujo plantio se inicia em setembro, ainda estará condicionada às condições climáticas, à ocorrência de pragas e doenças e às incertezas sobre investimentos em tecnologia, justamente por causa do aumento de custos.

A safra total de soja do Brasil também deve ser grandiosa, de 147 milhões de toneladas em 2022/23, projetou o Itaú BBA, em relatório. A estimativa representa aumento de 16,7% em relação à safra 2021/22. O banco também calculou aumento de 2% na área plantada com a oleaginosa e níveis de rendimento próximos aos do ciclo anterior. Ainda conforme o relatório, apesar do risco de faltarem fertilizantes, cujos preços estão nas alturas, além de outros insumos agrícolas, “a combinação de amplos estoques de fertilizantes no solo e aplicações mínimas permitirá bons níveis de produtividade no Brasil, caso não ocorram grandes choques climáticos”.

De olho nos adubos

Para o coordenador de Produção Agrícola da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Maciel Silva, o tamanho da safra de milho de inverno – outra importante colheita no País – em 2023 dependerá “muito mais de custos do que de preços”. Segundo ele, em live promovida na quinta-feira passada pelo Broadcast Agro, da Agência Estado, “os custos vão depender muito do comportamento dos fertilizantes, que têm dado sinais de arrefecimento de preços, o que pode ser uma sinalização positiva”. “O tamanho vai depender também do quanto será a ampliação da área da primeira safra de grãos, neste caso, especialmente da área de soja.” De todo modo, ele reconheceu que a safra 2022/23 deverá ser “a mais cara da história”, com produtores tendo menor margem de lucro.

Mesmo com todas essas variáveis, o agricultor brasileiro ainda promete uma colheita grandiosa. Segundo o Ipea, o vertiginoso crescimento da produtividade da agricultura “permitiu que os alimentos se tornassem mais abundantes e baratos”. “Se não fosse a redução da participação dos alimentos na renda das famílias desde a década de 1970 (de 50% para 20%), as políticas de transferência de renda, que ganharam força a partir do fim da década de 1990, não teriam a eficácia que tiveram, sem a queda no preço dos alimentos e a expansão da oferta produtiva de bens agropecuários”, disse, na nota do Ipea, o pesquisador Vieira Filho.

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