Levantamento de pesquisadora da Universidade de Brasília diz, porém, que internet ruim barra avanço mais robusto
Por José Maria Tomazela
Um amplo estudo sobre a difusão da agricultura digital no Brasil, realizado pela pesquisadora Maira de Souza Regis, da Universidade de Brasília (UnB), concluiu que a adoção de tecnologias digitais é um caminho sem volta para o setor rural, pois, além de agregar valor à produção, proporciona mais sustentabilidade ambiental, social e econômica aos sistemas agrícolas. Conforme a pesquisadora, os produtores acreditam que a agricultura digital favorece a sustentabilidade, além de reduzir os riscos inerentes à produção agrícola, principalmente os riscos climáticos.
Segundo o estudo, os produtores rurais, em grande maioria, são propícios a adquirir máquinas e equipamentos com toda a tecnologia embarcada, uma vez que grande parte já utiliza programas de controle de fluxo de caixa mensal e parte utiliza drones para gerar mapas de vegetação. O uso de softwares e aplicativos para gestão de propriedades é maior no Centro-Oeste, onde é adotado por 80% dos produtores.
A região com menos uso, com 41%, é o Nordeste. Os usuários de aplicativos de gestão de propriedade são em sua maioria (80%) proprietários de fazendas com grande extensão, de 500 a 1 mil hectares, sendo também mais propensos a fazer parte de grupos de troca de experiência, possuir consultores técnicos contratados e maior renda bruta anual.
A pesquisa apontou que a grande maioria dos produtores (96,3%) utiliza softwares e aplicativos de operações bancárias via internet, 90,74% de previsão climática, 90,71% para manejo agrícola e 70,37% para gestão de propriedades.
Ainda de acordo com o levantamento, 64,81% dos entrevistados utilizam programas de computador para planejamentos anuais, 62,96% programas de cálculo para controle de fluxo de caixa, 59,26%, indicadores para gerenciar as máquinas e a propriedade, 51,82% telemetria para transmissão remota de dados, 27,78% drones para mapear vegetação ou gestão de culturas e 14,81% sensores de vegetação.
A nova geração de agricultores, entre 20 e 30 anos, são os que mais utilizam softwares para manejo agrícola, com escolaridade superior completa ou pós-graduação, não sendo em regra de família de agricultores. As principais culturas em que a tecnologia digital está presente são os grãos, especialmente soja, milho, feijão e sorgo.
Constata-se, ainda, a forte relação entre o uso de softwares de gestão com o interesse do produtor em expandir os negócios, os quais obtêm uma renda bruta anual entre R$ 10 milhões e R$ 1 bilhão.
No entanto, foi constatada também a adoção de tecnologias digitais em propriedades a partir de 100 hectares e 10 funcionários. “Pode-se concluir que os agricultores estão cientes dos benefícios da agricultura digital e desejam digitalizar suas atividades, visto que os principais fatores que motivam a adoção são melhor controle de custos, melhor gestão e acesso às informações atualizadas”, afirma a pesquisadora.
Sem rede
O estudo observa que a falta de internet no campo é apontada como principal barreira para a digitalização. Segundo a pesquisadora, faltam estudos sobre a intensidade de utilização das principais tecnologias da agricultura digital para obtenção de uma visão geral das disparidades tecnológicas regionais, assim como o levantamento das áreas de produção que mais utilizam tecnologias digitais.
Para Maira é preciso saber se, com internet e com as máquinas e equipamentos disponíveis, os produtores teriam condições de conectar todos os processos da produção agrícola para a obtenção de informações úteis para a tomada de decisão. Além disso, o uso de ferramentas tecnológicas ainda não é vertical.
“Pode-se dizer que os produtores usam tecnologias de informação para realizarem transações bancárias, acessar a previsão do tempo e verificar cotações de preços. Usam muito a tecnologia da informação para a comunicação, mas não usam com a mesma frequência para a gestão do sistema de produção porque eles não percebem claramente os benefícios da agricultura digital. Ainda há muito a fazer em outras atividades dentro da produção agrícola e, além do tempo, é um processo que demanda orientação, acompanhamento técnico e incentivos de políticas públicas”, disse.
Oportunidade
O grande interesse do produtor rural brasileiro pela adoção de ferramentas digitais nas muitas etapas do processo de produção foi percebido pela startup Cromai, que surgiu há seis anos e atua no monitoramento de culturas como cana-de-açúcar e soja baseado em inteligência artificial. “Trouxemos uma abordagem que proporciona informações relevantes para análises e manejos estratégicos de culturas de forma integrada e automatizada, visando tomadas de decisões mais assertivas”, diz o CEO da startup, Guilherme Castro.
Com mais de 150 funcionários, a startup oferece soluções para grandes grupos de produção de cana-de-açúcar e de soja obtendo resultados como a redução média de 65% no uso de insumos químicos e de água nas plantações – o que corrobora o resultado da pesquisa, de que a tecnologia digital favorece a sustentabilidade. Segundo a Cromai, as ferramentas de inteligência artificial geram fluxos de informações que tornam mais eficiente o uso de defensivos. “Os agricultores aplicam somente onde é necessário, identificando as necessidades da lavoura via software para uma pulverização localizada”, disse Castro.
A startup, segundo ele, está atenta ao grande potencial de digitalização do agro brasileiro e se direciona da cana-de-açúcar para outras lavouras. “Há pouco mais de um ano, entramos no mercado da soja, avançando a partir do próximo ano nas culturas de milho e algodão”, afirmou.
Na Agrishow realizada em maio deste ano em Ribeirão Preto, a Cromai foi reconhecida com o Prêmio Agrishow de Startups pelo modelo inovador na aplicação de herbicidas.