Ferrovias trazem ganho ambiental e reduzem frete

26 de maio de 2021 8 mins. de leitura
Setor aguarda destravamento de projetos para aumentar transporte de grãos pelo modal, sobretudo em Mato Grosso

O agronegócio acompanha com expectativa uma série de ferrovias, cujos projetos estão em diferentes estágios e podem ampliar o volume de cargas por trilhos. Além de facilitar o escoamento de uma crescente produção de grãos, as ferrovias permitem redução das emissões de gases do efeito estufa e do custo do frete. Entre elas, a Ferrogrão, que ligará Sinop (MT) a Itaituba (PA), é a “menina dos olhos” do agro, ao diversificar opções de escoamento da safra principalmente de Mato Grosso, maior produtor de grãos do País. “É uma ferrovia de alto investimento inicial, mas escoará mais de 50 milhões de toneladas/ano do Centro-Oeste para os portos do Arco Norte”, diz o secretário nacional de Transportes Terrestres do Ministério da Infraestrutura, Marcello Costa. Outras com potencial de beneficiar o agro são as Ferrovias Norte-Sul, de Integração Centro-Oeste (Fico) e de Integração Oeste-Leste (Fiol). A Nova Ferroeste também é vista com bons olhos, assim como a possibilidade de expansão da Ferronorte ou Malha Norte de Rondonópolis até Lucas do Rio Verde (MT).

A Empresa de Planejamento e Logística (EPL) já possui cálculos sobre os benefícios de sustentabilidade das ferrovias, a partir de metodologia desenvolvida em parceria com o Instituto de Energia e Meio Ambiente. Segundo o diretor-presidente da EPL, Arthur Lima, a maior redução na emissão de gases do efeito estufa deve vir da Ferrogrão, de 1,4 milhão de toneladas de CO² equivalente/ano (tCO²eq) em comparação às emissões do mesmo fluxo de transporte rodoviário. Em seguida vêm Fiol, Fico e Tramo Central da Ferrovia Norte-Sul. Quanto à redução do preço do frete em relação ao modal rodoviário, entre as quatro ferrovias citadas acima, a maior economia seria obtida pela Fico, seguida de Fiol, Ferrogrão e Norte-Sul (veja quadro). Tanto Ferrogrão como Fico e Fiol estão pré-certificadas para eventual emissão de títulos verdes (green bonds). 

Segundo Edeon Vaz Ferreira, diretor executivo do Movimento Pró-Logística, ligado à Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT) e a outras entidades do setor produtivo, o Estado tem apenas a Ferronorte como opção de ferrovia, operada pela Rumo, que liga Rondonópolis à divisa entre Mato Grosso do Sul e São Paulo. Daí em diante, as cargas entram na Malha Paulista e seguem até Santos (SP). Isso pode mudar em cerca de cinco anos, segundo Ferreira, com a construção da Fico, que no seu primeiro trecho ligará Água Boa (MT) a Mara Rosa (GO), onde se encontra com a Norte-Sul. Segundo a Infraestrutura, a construção deve começar entre julho e agosto e será feita e paga pela Vale. “É uma obra de R$ 2,7 bilhões e não tem nenhum recurso do Orçamento-Geral da União”, diz Costa, do ministério.

“A Ferrogrão vai balizar os valores do frete cobrados pela Fico e Ferronorte”,

Edeon Vaz Ferreira, diretor executivo do Movimento Pró-Logística.

Produtores mato-grossenses depositam grande expectativa na Ferrogrão. “Ela balizará os valores a ser cobrados por Fico e Ferronorte”, diz Ferreira, acrescentando que o frete poderá cair 40% ante o mesmo trecho rodoviário. A Ferrogrão está sob questionamento no Supremo Tribunal Federal (STF), mas a expectativa do governo federal é de que o seu leilão possa ser realizado até o fim do ano. Na Corte, tanto a Aprosoja quanto a CNA entraram como amicus curiae na ação que, em março, teve decisão favorável à suspensão dos processos relacionados à ferrovia, por questões legais que envolvem o Parque Nacional do Jamanxim (PA).

Aprosoja e CNA argumentam em documento, por exemplo, que o traçado da Ferrogrão acompanha em aproximadamente 90% a faixa de domínio da rodovia BR-163, “o que reafirma que a supressão vegetal necessária para a construção da ferrovia é mínima”. Dizem também que a previsão de redução de Jamanxim é de 0,054% e que “essa intervenção, em termos de prejuízos ambientais, tende a zero”, se considerados os benefícios de redução da emissão de poluentes, congestionamentos e acidentes. O edital da ferrovia estima a redução de externalidades negativas em R$ 6,1 bilhões. As entidades afirmam ainda que o projeto será submetido a consulta pública e a licenciamento ambiental, que não há sobreposição do traçado com terras indígenas ou quilombolas e que o caminho referencial da ferrovia não invade unidades de conservação. Elisangela Lopes, assessora técnica de Logística e Infraestrutura na CNA, ressalta que a Ferrogrão pode se tornar uma obra “pioneira” entre os projetos greenfield de infraestrutura no Brasil, pela possibilidade de atrair investimento externo pelo ganho ambiental que proporciona. 

Marcello Costa, da Infraestrutura, afirma que o órgão “acompanha com naturalidade” a discussão no STF, e entende que não há irregularidade. O ministro Tarcísio de Freitas solicitou uma audiência com o relator do caso no STF, Alexandre de Moraes, e apresentou argumentos sobre a constitucionalidade da Ferrogrão. “Estamos na fase de aguardar uma posição definitiva dele ou o encaminhamento para o plenário da Corte.” 

Elisangela diz que qualquer quilômetro extra de ferrovia destinado a movimentar produtos do agronegócio é um ganho para o produtor, porque o custo ferroviário corresponde a 60% do rodoviário. Segundo ela, o agronegócio representava em 2019 só 16,4% de toda a movimentação de cargas nas ferrovias brasileiras. “Entendemos que ainda há necessidade de melhorar as rodovias, mas Ferrogrão, Fico e Fiol são relevantes para que o transporte ferroviário tenha papel mais atuante no agro.” A Ferrogrão deve ampliar “drasticamente” a participação dos grãos nas ferrovias, pois 80% da carga esperada é de soja e milho. 

No sentido contrário, de fluxo de cargas do Centro-Norte para o Sudeste, está a Ferrovia Norte-Sul, que teve um trecho inaugurado entre São Simão (GO) e Estrela do Oeste (SP) em março. Já está operando em São Simão um terminal de transbordo rodoferroviário, e a expectativa do setor produtivo é de ver o trecho entre Rio Verde (GO) e São Simão operante a partir de julho ou agosto. Quando a Fico for concluída, cargas do Vale do Araguaia (MT) também terão maior facilidade de descer para Santos (SP) pela Norte-Sul, já que as duas ferrovias terão interligação em Mara Rosa (GO). Hoje a produção da região segue de caminhão até o terminal em Palmeirante (TO) para então embarcar no Tramo Norte da Norte-Sul, rumo ao Porto do Itaqui (MA). “Esse corredor é muito importante, não só para fazer ligação e captura das cargas do Centro-Oeste e do Matopiba, mas pelo potencial para outros tipos de carga, como contêineres e frigorificadas”, afirma Costa. 

Na Bahia, a expectativa é com a Fiol. O trecho 1, de Ilhéus a Caetité, foi leiloado em abril para a Bahia Mineração. A empresa passa a ser responsável pela finalização dos 20% que restam da ferrovia e sua operação. Já a Fiol 2, que conforme o ministério está com obras em andamento e poderá ser leiloada em 2022, liga Caetité a Barreiras (BA), região agrícola. “Os grãos do oeste baiano que são levados por caminhão pela BR-242 até o Porto de Cotegipe (BA) irão de trem para Ilhéus (BA)”, projeta Ferreira. No trecho da Fiol 3, a ideia é interligar Barreiras a Figueirópolis (TO), ponto em que ela se conectará com a Norte-Sul e, por meio desta, com a Fico. 

Outro projeto é a expansão da Ferroeste. Para o coordenador técnico do Esalq-Log, Thiago Péra, é uma proposta interessante pela conexão com Mato Grosso do Sul, ampliando a exportação por Paranaguá e pelas regiões mais a oeste do Paraná e favorecendo o abastecimento interno. Estudos de viabilidade para desestatização da Nova Ferroeste foram entregues pelos governos de Mato Grosso do Sul e Paraná à Infraestrutura. Ela cortará o Paraná desde Paranaguá até Cascavel (PR), com dois ramais, um em direção ao sul, até Foz do Iguaçu (PR), e outro ao norte, até Maracaju (MS). O projeto poderá atrair cargas de Paraguai e Argentina.

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