Futuro é incerto para os produtores rurais de Brumadinho

11 de março de 2019 5 mins. de leitura
Agricultores atingidos pelo rompimento da barragem da Vale estão sem perspectiva de como voltar a trabalhar e honrar financiamentos contratados
A vida de Soraia Campos, agricultora da comunidade Parque das Cachoeiras, em Brumadinho, virou de ponta cabeça no dia 25 de janeiro. Naquela data, a barragem Córrego do Feijão, da Vale, rompeu e a lama com rejeitos de minérios, numa velocidade de 70 km/h, inundou a horta da produtora. Ela e os familiares não estavam lá, mas foram retirados 32 mortos do terreno onde Soraia cultivava hortaliças para o sustento da família. “Ainda me emociono quando relato isso, queria muito que fosse um pesadelo e que acordasse e estivesse tudo bem”, conta. Até o momento, a tragédia contabiliza 179 mortos e 131 desaparecidos.
Ainda não há um número oficial de produtores atingidos direta e indiretamente
Segundo a Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Seapa) de Minas Gerais, ainda não há um número oficial de produtores atingidos direta e indiretamente. O levantamento preciso deve levar – no mínimo – seis meses, uma vez que o colapso da barragem afetou não só os agricultores de Brumadinho, mas também das cidades pelas quais passa o rio Paraopeba, que recebeu a lama com os rejeitos de minério. De acordo com Mauro Pinto Soares, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Brumadinho, cerca de 110 produtores do município foram afetados pela tragédia. “Proprietários diretamente atingidos, que perderam a terra e não têm como plantar, são seis”, afirmou. Não há concordância quanto aos números. No caso de Soraia, que era meeira na propriedade, ela e outras dez famílias foram “privados” do sustento pela tragédia. “Hoje estamos desolados, dependíamos desta terra, desta água que não existem mais. Nossa renda vinha da agricultura”, diz. FUTURO INCERTO Após a tragédia, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) pediu ao Banco do Brasil (BB) que suspendesse até o dia 30 de dezembro deste ano o vencimento das parcelas de dívidas, referentes a financiamentos feitos por produtores rurais afetados pelo colapso da barragem da Vale. Além disso, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, pediu que os agricultores sejam atendidos pelo seguro rural. De acordo com a Secretaria de Agricultura Familiar e Cooperativismo (SAF) do Mapa, Brumadinho tem 182 declarações de aptidão ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf). No ano passado, esses produtores firmaram 52 contratos, que contabilizaram um volume de financiamento da ordem de R$ 1,75 milhão. Para Soraia, a Vale não tem dimensão de seu erro. “Além da matar centenas de pessoas, a empresa deixou muitos sem chão, literalmente, sem terra, sem água. O salário que ela [a empresa] vai dar por 12 meses ajuda, mas não soluciona o problema dos agricultores”, diz. Até o momento, a mineradora se comprometeu a pagar para todos os moradores de Brumadinho um salário mínimo mensal (R$ 998) para cada adulto, meio salário mínimo (R$ 499) para cada adolescente e um quarto de salário (R$ 249,50) para cada criança. Além disso, a Vale anunciou uma doação de R$ 100 mil para cada uma das famílias dos falecidos ou desaparecidos; R$ 50 mil para quem residia no que tem sido chamado de zona quente ou área de autossalvamento e R$ 15 mil para quem morava na zona quente e teve os negócios impactados.Mas para quem perdeu familiares, amigos, a propriedade e a fonte de renda, o amanhã é totalmente incerto.
“Eu sou agricultora e devo R$ 30 mil para o banco, mas tem produtores que pegaram empréstimo para investimentos maiores. Como vamos pagar? Estamos sem dormir, sem fome, num desespero total”, diz Soraia Campos, agricultora da comunidade Parque das Cachoeiras.
O rompimento da barragem Córrego do Feijão deu mais voz a movimentos sociais que questionam a forma como as mineradoras atuam no Brasil. A produtora agroflorestal Carolina de Moura Campos, de Brumadinho, é uma das ativistas. Ela mora no bairro da Jangada, que é vizinho do complexo Paraopeba, da Vale. “Estou a 10 quilômetros da mina Córrego do Feijão. Minha propriedade não foi diretamente atingida, mas já atuava de forma política, porque a expansão da mina da Jangada ameaça o território, onde eu moro, e a água”, diz. A preocupação de Carolina é com a manutenção dos recursos hídricos. Isso porque o processo de extração de minérios consome e polui muita água. “A partir do momento que explodem a montanha para chegar à camada geológica onde está o biominério, eles também destroem o aquífero, as nascentes de água. Em tempos de mudanças climáticas, não podemos contar com a chuva. É por isso que as nascentes subterrâneas e as terras, intactas, são vitais”, finaliza a produtora e ativista.      

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