“Lucro é o primeiro passo para a sustentabilidade”
31 de julho de 2017
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Essa é a opinião de Pedro Ronca, gerente no Brasil da Plataforma Global do Café, associação que une a cadeia produtora e tem por objetivo estimular boas práticas econômicas, sociais e ambientais no pequeno cafeicultor brasileiro
A Plataforma Global do Café é uma associação internacional com mais de 200 membros e atuação no Brasil, na Colômbia, na Indonésia, no Vietnã, na Tanzânia, em Uganda, em Honduras e no Peru, países que respondem por 75% da produção mundial de café. Seu objetivo é disseminar boas práticas de sustentabilidade, que garantam a rentabilidade do cafeicultor, bem como sua permanência na atividade e a proteção dos recursos naturais. Abaixo, os principais trechos da entrevista.
Quando surgiu a Plataforma Global do Café?
Ela foi constituída em 2016 e anunciada no fórum mundial da Organização Internacional do Café na Etiópia. Mas a atuação no Brasil vem desde 2012 com o programa Café Sustentável, que não existe mais. É uma associação e um programa de sustentabilidade que se uniram e formaram a Plataforma Global do Café, que tem mais de 200 membros no mundo e representantes de toda cadeia: produtores, indústria, traders e sociedade civil.
Qual é o objetivo da plataforma?
Estimular a melhoria da cadeia com foco no produtor, para que ele implemente práticas de sustentabilidade na propriedade, ações na área social, ambiental e econômica.
E quais são essas práticas?
São recomendações do currículo de sustentabilidade do café, que foi um documento elaborado com a cadeia, baseado na Produção Integrada da Embrapa. O currículo é um guia nacional pré-competitivo, não tem nenhuma questão comercial de certificação envolvida. É um alinhamento de conteúdo para que todo mundo trabalhe na mesma base. O objetivo é que o produtor melhore sua propriedade, implemente as práticas, aperfeiçoe a gestão, conserve os recursos naturais, a água e o solo. Trabalhe a questão social, a segurança do trabalho, a moradia e água potável para os funcionários, estes temas fundamentais para o bem-estar do trabalhador e do produtor, para a manutenção do meio ambiente e para a sustentabilidade econômica, para o produtor ter lucro.
E qual é o peso do lucro?
O lucro é o primeiro passo para a sustentabilidade. Um produtor que está no vermelho não vai pensar no verde. Ele só vai cuidar do meio ambiente, se preocupar com o social, usar equipamentos de proteção individual (EPI), se ele tiver lucro na atividade. Nosso foco principal é viabilizar economicamente esse produtor, ajudando ele a controlar o custo de produção, ter melhor gestão da propriedade, fazer boa nutrição da planta, análise de solo, controles de pragas e doenças, tudo para ter produtividade. Se tiver boa produtividade, terá mais chance de ter lucro. Se tiver lucro, poderá cuidar do social e do ambiental, nessa ordem sempre.
A plataforma tem atuação em oito países. Este currículo é o mesmo para todos?
Não, o currículo de sustentabilidade do café do Brasil é do Brasil e é feito de acordo com a nossa realidade. Do Vietnã é do Vietnã, porque os territórios são muito diferentes.
Isso é justo? As certificadoras adotam a legislação vigente no País, mas a legislação trabalhista brasileira, por exemplo, é muito mais exigente…
O currículo é baseado na legislação e não pode falar para o produtor cumprir menos do que a lei. Para sair dessa sinuca como plataforma, nós desenvolvemos os indicadores comuns de sustentabilidade junto com a cadeia para avaliar como o País está nas práticas. São 34 indicadores baseados nos 18 itens fundamentais do currículo brasileiro. No mundo, a plataforma está discutindo indicadores globais de sustentabilidade. Será uma lista para comparar países sem a régua da lei. Por exemplo, há países em que o uso de EPIs é lei, em outros não é.
73410cookie-check“Lucro é o primeiro passo para a sustentabilidade”
“Se o produtor tiver boa produtividade, terá mais chance de ter lucro. Se tiver lucro, poderá cuidar do social e do ambiental, nessa ordem sempre” Pedro Ronca, gerente do Programa brasil da Plataforma Global do CaféQuem são os parceiros da plataforma no Brasil? Temos parceria com cinco serviços de extensão públicos: Emater – MG; Emater – PR; Emater – RO; Incaper, que é o instituto de assistência técnica do Espírito Santo, e a CATI, em São Paulo. Fizemos essas parcerias porque são os que mais trabalham com o pequeno agricultor. O grande cafeicultor já é certificado, tem duas ou três certificações. O médio está indo para esse caminho e tem condições de contratar um agrônomo, uma consultoria. Estamos trabalhando com cooperação porque o desafio de estimular o pequeno a implementar práticas que levam à sustentabilidade é grande. Mas se ele implementar as 18 práticas do currículo, vai estar melhor como produtor e ter mais chance de se manter na atividade no longo prazo. As cooperativas e empresas se deram conta de que não vão conseguir mudar a realidade do campo trabalhando individualmente. Temos parcerias com a ABIC, ABICS, Cecafé, CNA, CNC, com as certificadoras, SENAR e SEBRAE. E como a plataforma trabalha? Capacitamos técnicos no currículo de sustentabilidade do café. Já treinamos 1.400 profissionais ligados a 73 instituições, que trabalham com assistência técnica no campo. Nossa ideia é que o agrônomo, ao visitar um produtor, além da correção do solo, olhe a propriedade como um todo, se tem área de proteção ambiental, como estão as nascentes, se os EPI são usados. Quais seriam os principais gargalos? Na área econômica, eu citaria produtividade e custo de produção. Muitos pequenos produtores têm baixa produtividade e menos de 10% sabem o seu custo de produção. Na área ambiental é a proteção das nascentes e cobertura de solo para evitar erosão. Na área de segurança do trabalho, eu destaco o uso de EPIs, principalmente para os trabalhadores que manipulam agrotóxicos e também o treinamento para aplicação desses produtos. E de onde vêm os recursos da plataforma? Somos uma associação e cada membro paga uma taxa anual para a plataforma desenvolver os trabalhos. O produtor paga x, o trader 2x e a indústria 6x. A indústria paga mais que o trader e mais que o produtor pelo valor agregado. A ideia é deixar os pequenos cafeicultores mais sustentáveis? Exato. O currículo é conteúdo, não é certificação, nem pretende ser. Se o produtor ganha dinheiro, preserva o ambiente, cuida da saúde de quem trabalha com ele, vai ter qualidade de vida e melhorar a qualidade de vida da comunidade, da cidade. É um ganha-ganha. Por isso chamamos de pré-competitivo: as empresas investem juntas e todo mundo ganha.